Era fim de tarde. Estava ouvindo música com meus pais e a conversa girava em torno de algo q nunca imaginei ser um dilema para minha mãe, aos 77 anos:
- Estou velha - disse ela, desanimada com a falta de firmeza na pele.- Você é velha, mãe. Idosa. E eu também estou ficando.
⠀
Não houve nenhum requinte de crueldade da minha parte. Era mais uma auto afirmação pra mim mesma, que estou cansada das propagandas q nos induz a realizar procedimentos para “envelhecer bem”. Como se o nosso natural fosse mal.
⠀
- Verdade. Você está com cabelo branco - disse pai.
- E ela está pensando em não pintar mais - disse mãe
- Eu acho q você deveria fazer o mesmo - replicou pai, se encaixando com naturalidade naquela conversa sobre os dilemas do universo feminino.
- Vamos? - perguntei- Juntas fica mais fácil. Uma apoia a outra. Estou cansada de mudar quem eu sou para me encaixar no que se convenciona como bonito
- Que profundo! Uma verdade - disse pai com ares de pensador.
⠀
Vendo q mãe não se animava, insisti e coloquei pra fora aquilo que rumino há meses.
⠀
- É sério. Não estou dizendo q vou ficar largada, sem cuidar de mim. Mas meus cabelos estão brancos! E isso eu não posso mudar. Que sentido tem pintá-los todo mês só para ficar “mais bonita"? Nos padrões de quem? E se eu assumir meus cabelos, eu ficarei feia? Confesso que tenho até medo de descobrir quem sou debaixo de toda essa tinta.
⠀
Silêncio
⠀
- Falou bonito - disse pai.
- Mas a transição será feia.
- Eu vou com você - disse mãe
- Você está falando sério?
- Estou.
⠀
Ficamos em silêncio novamente, como q refletindo sobre como será difícil encarar essa jornada. Por que não é apenas sobre deixar de pintar os cabelos. É sobre redescobrir quem você é e se sentir bem com isso. Mesmo que o “mundo” inteiro diga o contrário.
⠀
Se vamos conseguir? Não sei. Mas como dizem, é o primeiro passo que conta, certo?
0 comentários